terça-feira, 31 de março de 2015

O VOTO DO CIDADÃO, A LEI DE RESPONSABILIDADE E OS OPERADORES DO ESTADO

OPINIÃO

Não há de se esperar, dos operadores do Estado e dos governos, que dominem a perfeição oferecida pela constituição quando dimensiona os atos administrativos que estão sob suas responsabilidades

O processo eleitoral, exercido por meio do voto do cidadão é o pilar que sustenta a democracia. Extingui-lo é uma impossibilidade constitucional que afronta o estado democrático de direito.

O Estado e a administração pública, por outro lado, são entes caracterizados pela obediência à lei, independente dos processos eleitorais.

Duas verdades simples que podem confundir o pensamento cartesiano, burocrático e dogmático, que não é capaz de analisar situações que obrigam o uso do intelecto em questões aparentemente conflitantes...

Em qualquer repartição pública do nosso país, lemos com destaque o art. 331 do Código Penal que estabelece como crime o desacato de funcionário público, mas não lemos nenhuma que indique ser obrigação do servidor público, de acordo com a Lei 8.112/90, atender com presteza (inciso V do art. 116) e tratar com urbanidade as pessoas (inciso XI do mesmo artigo). Opta-se pela divulgação da punição e omite-se o direito ao tratamento digno. Outra verdade simples, mas que demonstra a opção pelo exercício do poder em detrimento da finalidade da administração pública, que é preservar o interesse público.>>>


Por esta razão, face ao predominante domínio do pensamento simplistas na aplicação das leis, assistimos, perplexos, o adiamento do que o eleitor determinou enquanto “mudança” por meio do processo eleitoral de 2014 no DF, sem qualquer indício de respeito ao interesse público (interesse do público). Ato que inaugura o estelionato eleitoral promovido pelos operadores do Estado.

Nesse desvio tecnoburocrático, à serviço do Establishment, se pode entender o caso da “punição”, aplicada ao governo Rollemberg e à sociedade brasiliense, com base na lei de responsabilidade, face ao desacerto nas contas públicas oriundas do governo Agnelo. Termina um governo e o início do outro é adiado, porque o governo anterior extrapolou “os limites com gastos de pessoal”.

Cabe perguntar: Se em 31 de maio (data final do adiamento do governo Rollemberg) permanecerem extrapolados os limites, teremos um novo adiamento? E o clamor do voto que quer mudanças, representado pelo processo democrático que é a base do estado de direito, será desconsiderado?

Claro que se pretende que a Lei de Responsabilidade seja aplicada, pois ela é um instrumento de controle da sociedade para evitar que o ato de governar se transforme em uma irresponsabilidade com a sociedade. Mas, em se tratando de troca de governo por meio do voto, como é o caso atual do GDF, não é admissível que falte aos aplicadores da lei agir conforme os princípios constitucionais da proporcionalidade (inerente à impessoalidade) e da eficiência, vez que a interrupção do governo Rollemberg fere frontalmente o interesse público de sanar, o mais rápido possível, as graves crises da educação, saúde, moradia e assistência social no Distrito Federal, somente para citar alguns exemplos.

Evidencia-se, portanto, que careceu do mínimo senso de conhecimento dos princípios constitucionais, o ato dos operadores das medidas saneadoras provocadas pela aplicação da Lei de Responsabilidade, ao optar, apontar e alegar apenas o princípio da legalidade na proibição do governo Rollemberg reorganização o GDF face aos limites impostos pela lei com gastos de pessoal. O art. 37 da Constituição federal determina que os atos da administração pública cumpram as exigências de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Princípios inscritos como um todo, a fundamentar o processo decisório. Nele não está impresso que é lícito optar por um dos princípios (legalidade) em detrimento dos outros.

Não há de se esperar, dos operadores do Estado e dos governos, que dominem a perfeição oferecida pela constituição quando dimensiona os atos administrativos que estão sob suas responsabilidades. Se reconhecemos a falta de qualidade do ensino, das faculdades e das universidades – que se esmeram em promover a qualificação dos estudantes para marcar X nas questões com base em gabaritos e provas de concursos públicos, haveremos de concluir que os princípios, normas e leis sucumbem, inexoravelmente, à interpretação superficial daqueles que aprenderam a encontrar apenas uma resposta correta para cada questão no mundo acadêmico, tornando-se incapazes de interpretar a conexão e interação entre as partes constitutivas da realidade prática. O povo não pode esperar. Como diz a canção de Vandré numa verdadeira mensagem aos saberes dos operadores do Estado, “...esperar não é saber. Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”.

Francisco Morbeck

Jornalista

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