6 de fevereiro de 2017, 16h27
Por unanimidade, a 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul decidiu manter a ação penal contra um político e empresário, uma juíza, um advogado e um delegado acusados de formar quadrilha num caso envolvendo corrupção, grampos ilegais, violação de sigilo funcional e quebra de sigilo bancário.
O acusado, empresário e político Eduardo Bottura é parte em mais de 3 mil ações em diferentes estados e já foi condenado mais de duas centenas de vezes por litigância de má-fé. Dessa vez, é acusado de formar uma quadrilha>>>
<<< em conjunto com seu advogado Eduardo Garcia da Silveira Neto, com a juíza Margarida Elisabeth Weiler e com o delegado Juvenal Laurentino Martins. Bottura nega o conluio e diz que a denúncia é inepta.
A decisão de manter o andamento da ação contra eles foi dada nesta segunda-feira (6/2), quando a 2ª Câmara Criminal acolheu, por três votos a zero, os embargos de declaração movidos pelo Ministério Público de Mato Grosso do Sul. Dois desembargadores haviam acolhido apenas parcialmente o pedido do MP, mas retificaram seus votos para acompanhar o segundo vogal, que apresentou voto-vista, concordando com a tese exposta pela acusação.
Em vídeo divulgado pelo WhatsApp, Bottura dizia ter certeza de que ação seria anulada no TJ-MS, mas errou a previsão.
Reprodução/vídeo
O caso tem sido evitado no Judiciário. Até agora, três juízes e um promotor já se declararam suspeitos para atuar na ação. Outro juiz declarou-se impedido. A estratégia de atacar os juízes até que eles decidam sair do caso é praxe nas milhares de ações que Bottura tem na Justiça. Em São Paulo, em outro processo, oito juízes se declararam impedidos para julgar o empresário e político. Os textos dos juízes e promotores são sempre muito semelhantes, se recusando a atuar em "processos em que seja parte a pessoa de Luiz Eduardo Auricchio Bottura".
A discussão chegou à pauta do TJ-MS depois de ter ido até o Supremo Tribunal Federal. No meio do caminho, em um Habeas Corpus no Superior Tribunal de Justiça, Bottura conseguiu que fosse reconhecida a inépcia da acusação de corrupção ativa, pois, de acordo com o ministro Jorge Mussi, o Ministério Público “deixou de indicar em que consistiria a vantagem indevida oferecida ou prometida” por ele à juíza e ao delegado em troca dos “favores” como a quebra do sigilo bancário e telefônico de desafetos do político.
Com isso, o caso voltou à comarca de Anaurilândia, onde tudo começou, para que fosse dado seguimento ao caso, sem a acusação de corrupção ativa. Bottura, no entanto, insistiu, em embargos de declaração no STJ, para que a ação penal fosse trancada. Os embargos foram negados pela corte.
Em outro recurso em Habeas Corpus, o STJ reconheceu a atipicidade da conduta descrita em relação ao crime de falsidade ideológica. Já no TJ-MS, o empresário e político conseguiu que fosse declarada a nulidade da denúncia ofertada na ação penal, com decisão que determinou que o Ministério Público ofereça uma nova peça acusatória, com exclusão dos crimes de corrupção ativa e falsidade ideológica.
Foi então a vez de o MP mover embargos de declaração, pedindo que a ação penal não seja anulada como um todo, mas apenas em relação aos dois crimes em questão. Assim, o processo continuaria, sem o risco de prescrição. Se for anulada, todos os crimes estarão prescritos.
Em parecer sobre o caso, o professor de Direito Processual da Universidade de São Paulo Gustavo Badaró afirma que as nulidades declaradas pelo STJ não devem afetar toda a ação, pois “repercutem exclusivamente sobre tais capítulos da acusação, não influenciando os demais, que deles são autônomos e sem relação de subordinação, dependência ou acessoriedade”. Assim, diz o professor da USP, cada capítulo da denúncia, ou seja, cada crime imputado, “poderá ser objeto de uma decisão autônoma em relação aos demais”.
Os desembargadores concordaram com a tese de Badaró e mantiveram a ação, anulando apenas as partes da acusação consideradas nulas.
Casos de novela
A denúncia do MP se baseia em um processo administrativo disciplinar que resultou na aposentadoria compulsória da juíza Margarida Elizabeth Weiler, que era titular na vara de Anaurilândia.
Segundo as investigações, no início de 2007, Bottura e seu advogado (que mantinha um relacionamento com a juíza) decidiram montar o esquema. Para isso, ofereceram vantagens indevidas à Margarida Weiler e ao delegado Juvenal Martins, que aceitaram participar do esquema.
"A referida quadrilha possuía divisões de tarefas, cabendo a Eduardo Bottura indicar as medidas que entendia necessárias para a obtenção de seus interesses para o advogado Eduardo Silveira, o qual acionava o delegado de polícia Juvenal Martins e a magistrada Margarida Weiler, de forma a dar suposta legalidade aos atos praticados", explica o documento do MP-MS.
Assim, eles conseguiram, por exemplo, condenar a ex-mulher do empresário, Patrícia Bueno Netto, e seu pai, Adalberto Bueno Netto, a pagarem R$ 100 mil para Bottura a título de pensão alimentícia. Além disso, a juíza determinou, sem a oitiva dos requeridos, o arrolamento de inúmeros bens, em decisão proferida dois dias depois de a ação ser ajuizada.
No esquema, segundo a denúncia, Bottura também conseguiu acesso a diversas informações sigilosas de seus desafetos. A prática ocorria da seguinte maneira: o empresário e seu advogado apresentavam uma denúncia sobre um suposto crime na delegacia. Sempre de acordo com a denúncia, o delegado Juvenal Martins instaurava o inquérito e, sem que houvesse um fato específico a ser investigado, pedia à juíza Margarida Weiler a quebra de sigilos telefônico e telemático, além de buscas e apreensões nas empresas dos acusados.
"Todas essas medidas foram determinadas sem que nenhuma prova existisse no inquérito policial que levasse à compreensão dos supostos 'crimes' alegados ou do envolvimento das pessoas indicadas. Havia, apenas, a petição e os documentos fornecidos unilateralmente por Luiz Eduardo Bottura e Eduardo Silveira", afirma o MP-MS.
Além disso, durante as atividades do grupo, a juíza forneceu sua senha de acesso ao sistema do tribunal a Bottura e a Eduardo Silveira. Com o acesso ao sistema, ambos começaram a despachar em processos de interesse do empresário, cabendo à juíza apenas assinar. Com a senha de servidores, que foram obrigados pela juíza a ceder o acesso, a denúncia narra que os dois também conseguiram executar materialmente as determinações judiciais, expedindo ofícios, mandados e cartas precatórias.
Embargos de Declaração 1410141-30.2016.8.12.0000
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 6 de fevereiro de 2017, 16h27
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