quinta-feira, 18 de junho de 2015

A CONSTITUIÇÃO NÃO PODE VALER MENOS QUE UM PUNHADO DE LARVAS DA FAUNA SILVESTRE

OPINIÃO
No nosso país o volume incalculável de desilusões e ações judiciais em virtude da inconstitucionalidade de leis, decretos, regulamentos, portarias e outros abusos cometidos por agentes públicos de todos os poderes, ainda não foi capaz de fazer uma única lei para punir esses algozes da insegurança jurídica.
À duras penas a constituição estabelece que o céu é de todo mundo, mas uma lei, sorrateiramente, pode instruir que todo mundo não é o mundo todo. Em seguida,>>>
para regulamentar a lei, um decreto pode especificar que não se inclui no “todo mundo” aqueles que não respeitam as leis. Daí, vem uma portaria - de qualquer um dos poderes, e diz que não respeitam as leis aqueles que não tem carteira de identidade ou título de eleitor. Ou, pior, que o céu é de todo mundo que acredita em Deus. Caramba, lá se foi a constituição e as leis para o ralo! Aí, é mais fácil fazer a montanha vir a Maomé do que modificar isso.
Os menos desiludidos tentam se socorrer na justiça... Aquela que depois de uma década de pareceres, sentenças e julgamentos contraditórios - em que nada se afirma com clareza -, pode determinar que não cabe a ela julgar se foi certa ou errada a decisão do poder público que retirou o céu da sua cabeça.   Minha nossa! Quanto desperdício de tempo, salário, papel, gasolina, energia elétrica, tonner, água, luz, telefone e esgoto para poluir os rios. Dez ou mais vezes os ipês floriram o chão de amarelo, branco e lilás. Dez ou mais vezes veio e foi-se o frio, a secura na boca, a chuva e os horários de verão. Centenas de mortes, acidentes de trânsito e nascimentos se passaram. Milhares de casamentos, separações, centenas de ônibus atrasados e salários que não aguentaram os meses. Muito tempo para nada.
Até a Câmara dos Deputados, que aprovou a constituição e as leis - pelas mãos de deputadas e deputados que foram à luta e acabaram eleitos pelo povo -, se vê obrigada a meter a colher em briga de marido e mulher. Parte logo para votar (novamente) um Decreto Legislativo para anular o artigo da portaria, que modificou o decreto, que alterou a lei, que negou a constituição. Santa paciência!
Até gostaria que tudo isso fosse exagero, mas não é. Negar cláusula pétrea da constituição, pode. Desdizer a lei, pode. Não tem artigo no Código Penal para punir quem comete esse tipo de crime que bagunça o país e faz a gente se sentir em terra de ninguém. O que não pode é vender, exportar ou adquirir, guardar, em cativeiro ou depósito, utilizar ou transportar ovos ou larvas da fauna silvestre... . Pra isso tem até Código Penal: detenção de seis meses a um ano, e multa.
Nesse ambiente em que extrair a seiva de uma árvore pode levar um homem à prisão, sobram frondosos gabinetes em que se aninham brutamontes que corrompem princípios constitucionais e legais na certeza de que não há pena que os alcancem. Um exemplo, para não ficar só na poesia, é o julgamento midiático das contas da presidente Dilma pelo Tribunal de Contas da União. Alguém leu no art. 71 da constituição que o TCU é “órgão auxiliar” do Congresso Nacional? Mas, desde Collor quem bate o martelo é o próprio TCU que, de tal modo agigantou-se – principesco, nababesco e ostentoso, que o Congresso treme diante do seu “órgão auxiliar”. Imagine-se olhando para suas mãos com medo de levar um tapa na cara e tá compreendido.
A constituição e as leis são a flora e a fauna de nossas vidas em sociedade. Para quem as modifica, danifica ou destrói, quero, pelo menos, a mesma punição do inciso II do § 1º do art. 29 da Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1.998 - para quem modifica danifica ou destrói um ninho, abrigo ou criadouro -, detenção de seus meses a um ano, e multa.
Francisco Morbeck
Jornalista e Advogado

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