sábado, 17 de janeiro de 2015

PAU QUE DÁ EM FRANCISCO DÁ EM CHICO

OPINIÃO
“Abundam ladrões e salteadores, quando o governo só confia em leis e decretos”
A frase acima, entre aspa, não foi pronunciada por nenhum opositor a esse ou àquele governo. Data de uns 600 anos antes de Cristo e foi extraída do livro Tao Te King, de Lao Tsé. Infelizmente, o antigo ensinamento não frequenta a seara da política, quando seus agentes optam pela má-fé ao lidar com o sagrado princípio do interesse público. Mas serve para qualificar o rol de decretos do ex-governo Agnelo no apagar das luzes de seu governo, entre eles o caso do IPTU inconstitucional cobrado das igrejas; a duvidosa inauguração do Centro Administrativo do DF e a armadilha do cancelamento indiscriminado de empenhos para fazer um “caixa artificial e fictício” à custa de deixar para o governo Rollemberg a herança da insegurança jurídica dos contratos com fornecedores, prestadores de serviço e conveniados.
Lembremos que o ex-governador Agnelo foi eleito sob o clamor do cidadão brasiliense nas eleições de 2010, que ansiava por “um novo caminho” político para o Distrito Federal. 
No entanto, sua primeira medida como governador eleito, foi promover um ardil: montar a poderosa Secretaria de Transparência e Controle. E, também por decreto, transformar a Corregedoria do Distrito Federal em “órgão interno” dessa Secretaria, subordinando-a e impedindo-a de exercer a fiscalização do governo, que é sua atribuição. Tudo lei e decreto, tudo bem planejado, a nos mostrar que a má-fé tem inigualáveis poderes.>>>

Em seguida, o “novo caminho” definiu o prime¬iro ato político para todos os órgãos do GDF: sob o manto da sua inquestionável legitimidade e legalidade, listar contratos e convênios em execução – leia-se, com dinheiro em caixa, e promover uma “visita surpresa” a todos eles.
Com essa instrução política, conforme subtendido pelo modus operandis que se instalou, foram feitos Relatórios de Visitas, posteriormente enviados à Secretaria de Transparência e Controle para “providências”. Sem contraditório, sem ampla defesa e outras normas constitucionais inerentes à Administração Pública. 
Em seguida, coube à Secretaria de Transparência “inspecionar” e “auditar” tais contratos e convênios, com base nesses “Relatórios de Visitas” forjados. Prática que não era nova e aqui no DF já tinha Arruda como professor. Em seu depoimento à polícia quando estava preso, ele detalhou como funcionou o pente fino sobre os contratos e convênios no Governo Roriz. Mas, coube ao ex-governador Agnelo transformá-la em marketing político, feito com muito esmero.
Na prática que se estabeleceu nessa trama, aos detentores desses contratos e convênios que não se “submeteram” ao modus operandis de “criar dificuldades para vender facilidades”, sobrevieram as denúncias na imprensa, por desvio de finalidade, fraude ou qualquer outro tipo de acusação, típicas dos que usam a confiança do eleitor para promover o abuso de poder. Nem a imprensa ousou duvidar. Revistas nacionais e jornais locais foram “recheados” dessas denúncias e julgamentos. Prática que, sorrateiramente, trocou as velhas bandeiras da ética, da legalidade e da moralidade na gestão da administração pública, pelo marketing orientado pela máxima do artífice nazista, Goebbels: “Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade”. Mas não é só.
Com a guilhotina brilhando sobre os pescoços desses “réus da Transparência”, sem uma só reunião com as partes, consulta, ata ou os incontáveis instrumentos legais a que a administração pública deve se submeter, interlocutores extraoficiais visitaram os denunciados para negociar, sob certas condições, é claro, a regularização dos contratos e convênios. Tudo tão legal e aplaudido que os denunciados, perplexos, viram-se capazes de se auto-incriminar, confirmando as palavras ditas pelo filósofo Sócrates contra seus acusadores antes de tomar a cicuta que o levou à morte. No pacote final de maldades, o envio de tais relatórios e inspeções para o Ministério Público.
Sem ruborizar, em quatro anos de governo o “novo caminho” imitou os tribunais de exceção: julgamento prévio, impedimento do direito de defesa e condenação confirmatória. Esse é o legado que o ex-governo Agnelo entregou nas mãos de Rollemberg um estado-governo sob suspeita, inconfiável, em virtude de sustentar a ma-fé e o abuso de poder com leis e decretos.
Nem seria preciso lembrar que a Secretaria de Transparência - órgão máximo desse marketing político de pretensa moralidade, não produziu nada sobre as denúncias de João Dias – o policial que jogou dinheiro na antessala do governador. Ou constatar, por mera curiosidade, que nenhum contrato da Novacap esteve no rol de suspeição. Sobre a obra superfaturada do Estádio Mané Garricha; os milhões gastos na Fábrica Social ou os R$350 milhões destinados à “jardinagem externa” do estádio da Copa, nenhuma palavra da Transparência. Indícios de recursos públicos desviados e suficientes para impedir o caos que seu governo causou à saúde e à educação públicas. Ao contrário, diante de qualquer tentativa de revelar o abuso de poder dos gestores do GDF, a bem bolada Secretaria de Transparência foi de agilidade impar, transformando em réus os acusadores e as vítimas dos crimes cometidos por eles. E mesmo assim, pasmem, fez escola, pois o comparsa que a implantou foi alçado à Controladoria Geral da União, onde hoje posa de bom moço.
Vê-se, nesse pequeno rascunho de estelionato eleitoral, que chamar o governo Agnelo de apagão de gestão é querer fazer poesia com o abandonado a que foi submetida à sociedade brasiliense. Seja no sucateamento dos hospitais e das escolas públicas, na precariedade das políticas de atendimento e regularização habitacional, na insuficiência das soluções de trânsito, na fragilidade do combate à violência e ao tráfico ou no descaso com os pequenos produtores rurais, o que se viu foi o Distrito Federal administrado por um governo sem interlocutores para os problemas do cidadão comum, mas com tempo de sobras para projetos faraônicos, nacionais e internacionais, de duvidosas boas intenções.
Entretanto, apesar desse cenário desolador, a sociedade brasiliense não deseja que o governo Rollemberg siga esse roteiro perverso que paralisou o governo Agnelo por mais de dois anos. A sociedade quer transparência com legalidade, eficiência sem má-fe e compromisso com a solução de seus problemas, aos quais se somaram os quatro anos de seu desgoverno. 
Porém, essa disposição do cidadão em renovar as esperanças para recuperar o orgulho de morar na capital da República, não desobriga o governo Rollemberg de promover ações necessárias e esclarecedoras para recuperar a imagem de Brasília no cenário nacional. Evidentemente, entre suas tarefas, inclui-se a necessidade de responder “professores de plantão” que usam a rede mundial de computadores para tentar ensiná-lo a ler extratos bancários, pois o eleitor brasiliense sabe que o caos instalado no Distrito Federal tem as impressões digitais desses mestres do ardil. É o povo que ensina Rollemberg: pau que dá em Francisco dá em Chico.
Francisco Morbeck

Jornalista

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