segunda-feira, 4 de maio de 2015

LIÇÃO DE AUTORITARISMO DE EDUCADORES

OPINIÃO

“Os homens investidos no poder creem na duração do presente”

Diante do autoritarismo, protestar é muito pouco. É preciso aprender que a vida ensina, mas não entrega de bandeja.

Nos obscuros tempos da ditadura militar - que empossou generais, coronéis, capitães, tenentes e outros patenteados em postos do governo federal, estadual e municipal, o Brasil também se viu às voltas com o debate de quem é mais qualificado para ocupar cargos de gestão na administração pública. Contra aquele consenso, ditatorial por óbvio, de que os militares eram os únicos qualificados para ocupar da presidência da República à administração do condomínio, foi fácil construir o consenso oposto que sempre começa pela negação: só por ser militar não se estava qualificado para a gestão da administração pública. 

Necessário se faz esclarecer que aquele consenso da aptidão dos militares foi abrupto, raso e imperativo. Mas impérios também se estabelecem com o tempo, como ervas daninhas que se espalham sorrateiramente.>>>

Daquela negação aos dias de hoje, o novo consenso, lento e afirmativo, consolidou o pensamento de que ninguém está mais apto a ocupar cargos de gestão governamental do que os trabalhadores das categorias a que a atividade da administração se dirige. Na saúde, médicos. Na segurança pública, delegados de polícia ou coronéis da polícia militar. Na educação, professores. 

Tão forte, determinante, regular e constante a consolidação desse novo consenso, que em algumas décadas pós-ditadura todas as categorias profissionais arvoraram-se na prerrogativa de ocupação dos cargos de gestão do Estado, inclusive influindo na edição de muitas leis criadas para garantir essa “reserva de competência”. Grandes lições que aprendemos com a benevolência do tempo, que poderia nos arrastar através de décadas sem nenhuma possibilidade de reconhecer como é frágil e inconsistente esse novo consenso. Mas, felizmente, fomos premiados pela Secretaria de Educação do DF com a triste confirmação da máxima de Maquiavel: “Dê o poder ao homem, e descobrirá quem ele realmente é”. Esclareço.

Em tempos atuais, de desafiantes ventos democráticos, dois professores do Distrito Federal, secretário de educação e adjunto, sem qualquer indício da experiência militar autoritária senão pela condição de vítimas, reproduziram triste enunciado de proibição do acesso da sociedade à informação quanto à realidade das escolas, promovendo um nível de controle de acesso e veiculação - censura, que em nada se diferencia do obscurantismo que nos pregou o militarismo em mais de duas décadas. Perplexidade para milhares de professores e educadores às voltas com a construção da cidadania. Onde estudaram esses senhores? De que teoria educacional retiraram suas ilações sobre democracia, liberdade, acesso da sociedade à informação e pátria educadora? Podemos colocar na conta do socialismo de Rollemberg essa triste passagem?
Não queremos, é claro, crucificar os autores desse “desvio autoritário”, nem o governo Rollemberg, mas o fato nos obriga a refletir sobre a fragilidade desse novo consenso de administração da educação por professores e outros correlatos. 
A administração pública é tarefa para cidadãos sintonizados com o interesse público e podemos encontrar esse perfil tanto naqueles que transitam pelo seio de categorias profissionais, quanto naquela senhora pobre que dispõe de suas forças para reunir colaboradores e fazer cestas básicas para doar aos necessitados. Mas podemos afirmar sem susto: esses cidadãos, tão necessários à sociedade e aptos à gestão da coisa pública, não serão encontrados entre aqueles que confundem gestão (ato do indivíduo a serviço da coletividade) com despotismo (ato do indivíduo que utiliza de seu poder para tiranizar e oprimir os que não seguem as suas normas).
O désposta eleva o custo social da administração pública pois, submisso à sua vontade e não às necessidades da sociedade, “cria” mais problemas do que resolve. Principalmente quando, investido no poder, crê na duração do presente, como no pensamento que nos legou Madame de Staël,expulsa de Paris por Napoleão Bonaparte. 
E será o mesmo tempo que nos socorrerá contra esse consenso das especialidades como critério para a escolha de gestores da coisa pública. Como bem relativizou Chico Buarque: “Apesar de você, amanhã há de ser outro dia”.

Francisco Morbeck
Jornalista




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