27/06/2013
PATRIMÔNIO PÚBLICO X PATRIMÔNIO NACIONAL
O consenso da preservação do
patrimônio público contra a depredação não é, apenas, dos órgãos policiais que
tem o dever de o defender. Está na boca de todos: justiça, educação,
administradores públicos, ministério público e da própria população. Ninguém
pode quebrar uma vidraça ou “pichar” uma parede. Consequentemente o consenso
avança para justificar ações de “efeito moral” dos órgãos de segurança contra
os depredadores: bombas de gás lacrimogênio, spray de pimenta e balas de
borracha.
Depois desse consenso nacional contra as
depredações durante as manifestações juninas pelo país afora, soa estranho, no
entanto, que em 27 de junho programas de televisão e jornais divulgassem uma reintegração
de posse na periferia de São Paulo, com máquinas derrubando construções
improvisadas e a polícia lançando bombas de gás lacrimogênio, spray de pimenta
e balas de borracha nos cidadãos que resistiam à desocupação. Afinal, esses
cidadãos são “baderneiros”, “arruaceiros” e “bandidos” como aqueles que se
aproveitaram dos protestos pacíficos nas ruas do Brasil? Se sim, que
“patrimônio público” estavam ameaçando? Se não, por que foram tratados como
bandidos?
Por outro lado, diante da evidência de excessos
praticados pela polícia, amplamente registrados pelos meios de comunicação, soa
falso que os comandantes dessas corporações declarem que suas “corregedorias”
vão instaurar investigações para punir os culpados. Isso não é garantia nenhuma
de isenção para a sociedade, muito pelo contrário.
Nesse mesmo diapasão, soa absolutamente
incoerente que governos criem organismos internos de “transparência” para
averiguar suas próprias ações. A transparência que a sociedade requer é a
disponibilização de informações, para que órgãos externos (aí incluso o
Ministério Público) ou independentes (sociedade civil) promovam a análise dos
fatos e exijam a punição dos culpados pela justiça.
O movimento extraordinário que ocupou as ruas do
Brasil quer mais do que redução de tarifas, passe livre estudantil e outros
benefícios, quer uma mudança de paradigma na administração pública de todos os
níveis, onde o cidadão em luta por seus direitos fundamentais, aí incluso a
moradia, não sejam tratados como bandidos que “desobedecem a lei” e a
propriedade privada não seja defendida como se fosse patrimônio público.
Nesse sentido, não se admite mais que a justiça,
que não tem nada de isenta, pois a isenção é um discurso vazio, conceda a
reintegração de posse e a expulsão de cidadãos desassistidos pelas políticas
públicas sem dar-lhes (ou exigir dos governos) uma solução decente para o
problema social criado por sua incapacidade de fazer do Brasil um país de
todos. Afinal, não podemos admitir que a lei seja expressão da ilegalidade, nem
que a justiça seja a expressão da injustiça. Se não se pode quebrar vidraças
(patrimônio público), muito menos se pode ferir ou agredir cidadãos (patrimônio
nacional).
Chico Morbeck
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