Nas últimas três décadas tivemos de conviver com o discurso da elite paulistas e, particularmente, do PSDB nas campanhas estaduais e nas eleições presidenciais no estado de São Paulo. Não houve qualquer ameaça dos partidos de esquerda a esse cenário. E cabe perguntar: justo onde nasceu o Partido dos Trabalhadores? Coisa que pode parecer inaceitável, incoerente e inconcebível. Para se sincero, pode mesmo parecer incompreensível. Afinal, há algo em São Paulo que impede que as chamadas esquerdas alcancem significação eleitoral? Para um pensador e escrivinhador, nada pode ser pior do que a ansiedade de viver tanto tempo sem resposta plausível para um dilema. E esse foi piorando a cada quatro anos.>>>
Mas, como até a paixão de Cristo teve um fim, esse estado de angústia começou a me abandonar em 2014, quando tive a chance de acompanhar o horário eleitoral do estado de São Paulo. Foi dessa experiência que pude encontrar uma pista para a solução do enigma.
Observando bem, sem os tremores da paixão – coisa que só é possível ao coração forjado de amores encantados e desencantados, vi que lá estava Tiririca, dando banho na política tradicional com sua criatividade. Maluf também, com seu velho discurso do “nós os paulistas”. E, claro, não faltaram centenas de candidatos de 1, 2, 3, 4 ,5, 10, 15 e 30 segundos, tentando explicar o inexplicável em tempo recorde. Tarefa que reprovaria os maiores estadistas, filósofos, pensadores e doutores de todos os tempos.
Aos poucos fui apagando aquilo que me pareceu igual e passei a observar com maior atenção o “diferente”. Além do Tiririca, óbvio, pude observar que o discurso do PSDB batia numa tecla que eu desconhecia até então: a de que o “estado de São Paulo era sangrado pelo governo federal – em Brasília - com os impostos nas alturas”. Que o “estado de São Paulo não recebia de Brasília o retorno dos impostos que eram arrecadados dos paulistas”. Ou seja, São Paulo era explorado por Brasília, leia-se, governo federal.
Por um momento lembrei do discurso dos “brasileiros do século XVIII” contra a Coroa Portuguesa, na ânsia de verem-se livres dos impostos e sonhando com a independência.
Por outro lado, dada a tendência mais ou menos comum de seus militantes, o discurso dos candidatos do que podemos nominar de esquerda, Partido dos Trabalhadores, inclusive, repetia o mote nacional, falando em bolsas disso e bolsas daquilo, realizações do “minha casa minha vida” pelo país, financiamento da educação superior etc. Difícil, mas valeu o esforço.
Quatro dias extenuantes de propaganda eleitoral e dei-me conta de que uma parte do mistério fora desvendado: o PSDB batendo na tecla de que o governo federal sangrava São Paulo e o PT fortalecendo essa visão dizendo como o governo federal “gastava o dinheiro que arrecadava em São Paulo” com seus programas para os brasileiros. Sem dúvida, uma lavada eleitoral de votos nas urnas do PSDB, sempre. Sempre que esse discurso se repetir.
Com metade do mistério resolvido, fui à procura da outra metade. Conversei informalmente com alguns deputados federais do bloco paulista Dilma-Lula ou Lula-Dilma, indagando se sabiam o porquê das constantes derrotas eleitoras do PT contra o PSDB em São Paulo. Para minha surpresa, as respostas confirmaram que, também para eles, tratava-se de um mistério.
Pelo que aprendi da audiência da propagando eleitoral, o PSDB repete o que diziam os Bandeirantes – até hoje reverenciados por eles. Discurso conveniente como estratégia de “proteger” São Paulo contra a sanha arrecadatória do governo federal – leia-se, Brasília-Brasil. Mas, em última análise, um perigoso jogo de palavras que pode reacender velhas ideias separatistas derrotadas no passado.
Como um mistério gera outro mistério, à conclusão do perigoso discurso separatista juntou-se uma indagação: ninguém vê isso? E a resposta a essa questão resolveu a outra parte do mistério.
O discurso da base Lula-Dilma não consegue vencer o PSDB (paulista) nos embates eleitorais porque, em sua maioria, também são paulistas e, provavelmente, pensam a mesma coisa do Brasil.
Triste conclusão para os brasileiros que amam cada pedaço desse país e apreciam o queijo clandestino de minas gerais, a comida bahiana, o pato no tucupi, o arroz carreteiro, o piqui, o pão de queijo, o pão com mortadela, o virado à paulista, a carne de sol, a farinha, a rapadura. Somente quando for possível combater o discurso separatista do PSDB com a demonstração, para os paulistas, de que o Brasil não vive à custa de São Paulo; que o Brasil é sim o maior cliente que São Paulo tem; que São Paulo não viveria sem o Brasil, porque é o Brasil que compra tudo o que São Paulo produz. Consequentemente, cada programa social implantado pelo governo federal no Brasil é garantia de que haverá dinheiro para comprar os produtos de São Paulo. Somente com esse enfrentamento será possível reescrever a história política do estado de maior potencial econômico do Brasil. Paulistas são brasileiros. São Paulo é Brasil.
Francisco Morbeck
Jornalista
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