Alguém em sã consciência precisa
esclarecer se somos verdadeiramente um país ou uma confederação de
tecnoburocratas.
Alguém já imaginou a França sem os
famosos vinhos artesanais? Ou o Japão sem o sushi e o sashimi? Apenas como
exemplo, chegar nesses dois países e não encontrar tais iguarias é quase uma
constatação de que você não está no país certo. Quem ousa chamar de fedido um
queijo gorgonzola? Seria uma ofensa imperdoável à nação italiana. Cada um
desses países considera suas iguarias um traço de sua identidade cultural, sem
os quais simplesmente não existiriam como nação.
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Banido no seu próprio país, o queijo minas é iguaria jogada na clandestinidade |
No Brasil situação muito diversa
ocorre, quando o assunto é queijo de minas, queijo coalho, rapadura nordestina ou charque
riograndense. São iguarias consumidas e reconhecidas como identidades culturais
de seus estados, como muitas outras iguarias populares em todos os estados do
Brasil, mas são atiradas na ilegalidade pelos ditos órgãos fiscalizadores. Desde
2008, registre-se, o pão de queijo foi reconhecido como patrimônio imaterial
pelo ministério da cultura. E dai?
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Importante fonte de combate à anemia, a rapadura não tem trânsito livre no país |
Acontece que o queijo curtido, com o
qual se faz o pão de queijo tradicional de minas, é comercializado em todo o
país como contrabando, pois a Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde não
foi informada da importância dessa iguaria para a nossa identidade como nação.
Certamente os técnicos sanitaristas não cometem o crime de incentivar esses
contrabandos consumindo pão de queijo ou mocotó com farinha. Similarmente, o
mesmo ocorre com a rapadura e todos os produtos artesanais brasileiros que são
obrigados a atravessar fronteiras nas surdinas para driblar a insanidade dos
órgãos públicos que criam regras e mais regras para colocar esses produtos na
clandestinidade.
O argumento da Vigilância Sanitária
é recheado de normas destinadas à “proteger” os brasileiros dos perigos do
consumo desses alimentos artesanais, que nunca foram responsáveis por nenhum surto,
doença ou contaminação fulminante em suas regiões de origem, mas,
milagrosamente, transformam-se em produtos perigosos para o consumo quando
cruzam as fronteiras estaduais.
Para desgosto da nação brasileira, nenhum
partido, parlamentar, juiz ou membro do executivo fez coro, manifesto, projeto
de lei, sentença ou coisa que o valha para acabar com esse abuso dos órgãos
fiscalizadores que parecem não funcionar em defesa da cultura nacional. Tudo
indica que copiam normas e regras ditadas por interesses industriais que reservam
para si o mercado de consumo, procurando forçar o povo brasileiro a trocar o
charque pelo hambúrguer, o pão de queijo pelo croissant francês e a rapadura
pelo chocolate suíço. Um desastre sem
precedentes contra a diversidade cultural nacional que destrói a economia
familiar de subsistência e a sobrevivência das pequenas propriedades para
favorecer a disseminação de shoppings e o fast foods como modelos de comércio e
de produtos de consumo.
Curiosamente, esses técnicos ciosos
que colocam na clandestinidade milhares de produtos da cultura nacional, viajam
para o exterior e frequentam feiras em Istambul, camelôs em Marrocos ou Lisboa
e comidinhas de beira de ruas em Londres ou Pequim. Enquanto o queijo mineiro,
o charque gaúcho, a rapadura nordestina, a farinha de mandioca e tantos
produtos artesanais da culinária nacional forem impedidos de cruzar esse país
livremente, o povo brasileiro não pode sair das ruas. Libertas quae será tamen ou revolução já!